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Mudam-se os tempos - Luís Vaz de Camões


Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, 
Muda-se o ser, muda-se a confiança: 
Todo o mundo é composto de mudança, 
Tomando sempre novas qualidades. 

Continuamente vemos novidades, 
Diferentes em tudo da esperança: 
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem (se algum houve) as saudades. 

O tempo cobre o chão de verde manto, 
Que já coberto foi de neve fria, 
E em mim converte em choro o doce canto. 

E afora este mudar-se cada dia, 
Outra mudança faz de mor espanto, 
Que não se muda já como soía. 

Luís Vaz de Camões

Sem causa, juntamente choro e rio - Luís Vaz de Camões


Sem causa, juntamente choro e rio
(Luís Vaz de Camões)

Tanto de meu estado me acho incerto, 
Que em vivo ardor tremendo estou de frio; 
Sem causa, juntamente choro e rio, 
O mundo todo abarco, e nada aperto. 

É tudo quanto sinto um desconcerto: 
Da alma um fogo me sai, da vista um rio; 
Agora espero, agora desconfio; 
Agora desvario, agora acerto. 

Estando em terra, chego ao céu voando; 
Num' hora acho mil anos, e é de jeito 
Que em mil anos não posso achar um' hora. 

Se me pergunta alguém porque assim ando, 
Respondo que não sei; porém suspeito 
Que só porque vos vi, minha Senhora. 

O desconcerto do mundo - Luís Vaz de Camões


O desconcerto do mundo
(Luís Vaz de Camões)

Os bons vi sempre passar
No mundo graves tormentos;
E para mais me espantar,
Os maus vi sempre nadar
Em mar de contentamentos.
Cuidando alcançar assim
O bem tão mal ordenado,
Fui mau, mas fui castigado:
Assim que só para mim
Anda o mundo concertado.

Amor é um fogo que arde sem se ver - Luís Vaz de Camões


Amor é um fogo que arde sem se ver
(Luís Vaz de Camões)

Amor é um fogo que arde sem se ver; 
É ferida que dói, e não se sente; 
É um contentamento descontente; 
É dor que desatina sem doer. 

É um não querer mais que bem querer; 
É um andar solitário entre a gente; 
É nunca contentar-se e contente; 
É um cuidar que ganha em se perder; 

É querer estar preso por vontade; 
É servir a quem vence, o vencedor; 
É ter com quem nos mata, lealdade. 

Mas como causar pode seu favor 
Nos corações humanos amizade, 
Se tão contrário a si é o mesmo Amor? 

Busque Amor - Luís Vaz de Camões


Busque Amor novas artes, novo engenho, 
para matar-me, e novas esquivanças;
que não pode tirar-me as esperanças,
que mal me tirará o que eu não tenho.
Olhai de que esperanças me mantenho!
Vede que perigosas seguranças!
Que não temo contrastes nem mudanças,
andando em bravo mar, perdido o lenho.
Mas, conquanto não pode haver desgosto
onde esperança falta, lá me esconde
Amor um mal, que mata e não se vê.
Que dias há que n'alma me tem posto
um não sei quê, que nasce não sei onde,
vem não sei como, e dói não sei porquê. 

Luís Vaz de Camões